segunda-feira, 23 de outubro de 2017

047- Aceitação de si mesmo


Atualmente muitas “escolas” postulam que as pessoas devem aceitar a si mesmas, que devem amar, respeitar, valorizar e dar importância a si próprias.  Mas aceitar a si mesmo não significa se auto adorar.  Aceitar-se é uma postura diametralmente oposta à auto importância, que, se manifesta com grande frequência em todos nós e é ensinada como boa prática, quando, na realidade, deveria ser mostrada como um dos grandes grilhões que nos trazem sofrimento, como efetivamente é.
Aceitar-se é um ato de humildade, de simplicidade.
De forma pouco sábia, estas “escolas” ensinam que as pessoas devem pensar mais em si próprias, em seu conforto, prosperidade, prazeres, agindo sempre em seu próprio benefício.  Afirmam que aqueles que pensam demais no próximo, esquecem de si e acabam sofrendo.  Mas isso não é verdade.  A verdade é que as pessoas só pensam em si mesmas.  Se fazem algo para agradar o outro, é pensando nos benefícios que podem obter tal gesto, e não porque pensam no outro.  Estão pensando no reconhecimento que poderão receber, estão querendo ser aceitas, adoradas, aplaudidas.   Esse desprendimento de pensar no outro desinteressadamente não existe, é um equívoco, uma fantasia.  Estamos por demais adormecidos para podermos pensar em alguém que não seja em nós mesmos.
Ensinam-nos, ainda, que, quando as pessoas experimentam algum tipo de prazer, estão fazendo a vontade da alma.  Este é mais um de seus equivocados ensinamentos.  Na verdade, aqueles que se entregam aos prazeres, estão apenas a satisfazer o ego.
O Budismo, o Hinduísmo e o Cristianismo pregam que todo sofrimento tem raízes na cobiça, na ira, na ignorância.  E, em sua profunda ignorância, algumas “escolas” estimulam seus adeptos a desenvolver o orgulho, pregam cobiça, reforçam a liberação da raiva, incitam à vingança.  Nada disso é compatível com a aceitação de si mesmo.  Essas atitudes estão na contramão do processo de auto-aceitação.  Aquele que se aceita e aceita o próximo não pensa em vingança jamais.
Assim, o que precisamos verdadeiramente é pensar menos em nós mesmos, em nossos desejos, em nossa ganância, vaidade, orgulho.  Pensar apenas em nós mesmos é um caminho que leva à inveja, à mágoa, ao ressentimento, ao medo, à vergonha e à raiva.  Tal tendência é uma das grandes causas do sofrimento humano.  Por isso, muitos mestres recomendam o exercício caridade.  Para que, aos poucos, criemos o hábito de pensar no próximo.
Se bem observarmos, veremos que toda ideia de prosperidade, que atualmente circula no mundo espiritualista, de forma geral, não passa de um culto à cobiça, à inveja, ao desejo, o que acaba levando à competição, à ira e à frustração.
Aceitar-se não significa, de forma alguma, entregar-se aos desejos.
O anelo da alma, a vontade da alma, não deve ser confundido com o desejo concentrado do ego.  Porém, mais prejudicial ainda do que o desejo concentrado do ego é o desejo disperso do ego, pois desejar coisas antagônicas, desejar algo diferente a cada instante é uma fonte permanente de sofrimento.
Percebamos, pois, que esses “ensinamentos” sobre prosperidade significam apenas tentações para os nossos desejos, para os nossos demônios internos.
É evidente que aceitar a si mesmo não equivale a um ato de repressão.  Uma coisa é reconhecermos que temos raiva e trabalharmos sobre ela, outra, bem diferente, é simplesmente liberarmos a raiva, que é tão nocivo quanto não aceitarmos que estamos com raiva ou fingirmos que não estamos com raiva.
A auto-aceitação parece algo paradoxal à primeira vista.
Quando não sabemos quem somos, queremos parecer algo que não somos, mas que acreditamos ser.  E, neste caso, dependeremos da aceitação dos outros.  Reagiremos negativamente a qualquer manifestação que se oponha aquilo que achamos que somos.
Quando sabemos quem somos, ou pelo menos quando começamos a perceber o que não somos, tudo aquilo que fazem ou dizem a nosso respeito não assume grande importância.  Podemos, inclusive, aproveitar o que fazem ou dizem em favor de um novo aprendizado ou um aprofundamento.
Aceitar a si mesmo não é um estado passivo.  Muito pelo contrário, é uma grande ação – a ação consciente de aceitar a si mesmo.
Ora vivemos de abordar alguns de nossos atributos, ora de rejeitar outros.  A aceitação de si mesmo está muito além destas duas polaridades.
Enquanto se deseja algo, não há espaço para a aceitação de si mesmo.  Para nos aceitarmos, precisamos atingir um estado de contentamento, satisfação, gratidão.
É importante observar, perceber, compreender, que o orgulho e a vaidade são antípodas da auto-aceitação, e que geram apenas dor e sofrimento.

Não podemos cair no auto-engano, não podemos criticar ou culpar a nós mesmos por nossos defeitos.  Tampouco devemos negar a existência deles ou exaltar nossas virtudes.  Cada um de nós possui virtudes e defeitos em diferentes graus, que, por sua vez, se equilibram, apresentando pouca diferença de gradação entre os indivíduos.  Assim, as aparentes diferenças entre os seres humanos são apenas ilusões.  Diante desta compreensão, seremos capazes de reduzir em nós boa parte da preocupação em parecermos algo que não somos aos olhos alheios.  Diante desta compreensão, seremos capazes de executar um trabalho mais tranquilo sobre nós mesmos, pois todos temos os nossos defeitos e virtudes, e não há problema algum nisto.  Basta aceitarmos os fatos e trabalharmos no cultivo de nossas virtudes e no extermínio de nossos vícios e defeitos.  Está é a busca da purificação em si.


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