CEBRID
– Centro Brasileiro de Informações sobre
Drogas
Psicotrópicas
Definição
e histórico
Em
1866, um médico da Bahia descreve o seguinte quadro em dois
escravos: “Fui chamado a visitar este doentes no dia seguinte às 8
horas da manhã. Já podiam caminhar, mas estavam ainda trôpegos e
hallucinados, vendo objetos himaginários, phantasmas, ratos a
passear pela camara, etc., de que procuravam fugir dirigindo-se para
a porta. Ambos tinham as pupilas dilatadas... a boca e fauces nada
oferecem de notável... Na panela que servia para fazer o cosimento
estavam dois ramos com muitas folhas e algumas flores rudimentares,
de uma planta que conheci ser trombeteira (Datura arborea, Lin)”...
Em
1984 um jovem advogado de São Paulo narrou sua experiência. Após
ingerir chá de saia branca: “Os sintomas iniciam-se cerca de 10
minutos mais tarde com queixas de não enxergar direito, vendo tudo
embaraçado e fora de foco”. As pupilas estão totalmente
dilatadas. Seguem-se alucinações terrificantes, visão de animais
e plantas ameaçadoras, cadáveres de índios, pessoas, etc. Algumas
horas mais tarde relata que perdeu o pulso e engoliu a língua sendo
levado para o pronto socorro”.
Ainda
em uma manhã de 1989 um menino de rua com as pupilas muito dilatadas
descreveu o que sentia após tomar 10 comprimidos de Artane: “via
elefante correndo pela rua e rato saindo do buraco, se olhava para o
céu via estrelas de dia. Tava tudo embaçado e dava medo, mas era
também bonito”.
Conforme
pode-se ver pelas descrições acima, tanto o chá da planta como o
medicamento Artane foram capazes de produzir dilatação das pupilas
(midríase) e alterações mentais do tipo percepção sem objetivo
(ver ratos, índios e estrelas quando estes objetos não existiam),
isto é, alucinações.
O
que existe de comum entre a planta Trombeteira ou Lírio e o
medicamento Artane para produzirem efeito físicos e psíquicos
semelhantes? É que duas substâncias sintetizadas pela planta
atropina e/ou escopolamina – e o próprio remédio tem um efeito no
nosso organismo que a medicina chama de efeito anticolinérgico.
E
sabe-se que todas as drogas anticolinérgicas são capazes de, em
doses elevadas, além dos efeitos no nosso corpo, alterar as nossas
funções psíquicas.
Efeitos
no cérebro
Os
anticolinérgicos, tanto de origem vegetal como os sintetizados no
laboratório, atuam principalmente produzindo delírios e
alucinações. São comuns as descrições pelas pessoas intoxicadas
de se sentirem perseguidas, de verem pessoas e bichos, etc. Este
delírios e alucinações dependem bastante da personalidade da
pessoa e de sua condição, assim, nas descrições de usuários
destas drogas, encontram-se relatos de visões de santos, animais,
estrelas, fantasmas, entre outras imagens. Os efeitos são bastante
intensos, podendo demorar até 2-3 dias. Apesar disso, o uso de
medicamentos anticolinérgicos (com controle médico) é muito útil
no tratamento de algumas doenças como, por exemplo, a Doença de
Parkinson.
Efeitos
no resto do corpo
As
drogas anticolinérgicas são capazes de produzir muitos efeitos
periféricos. Assim, as pupilas ficam muito dilatadas, a boca seca e
o coração pode disparar. Os intestinos ficam paralisados – tanto
que eles são usados medicamente como antidiarréicos – e a bexiga
fica “preguiçosa” ou há retenção de urina.
Efeitos
tóxicos
Os
anticolinérgicos podem produzir em doses elevadas grande elevação
da temperatura que chega às vezes até 40-41ºC. Nestes casos,
felizmente não muito comuns, a pessoa apresenta-se com a pele muito
seca e quente com vermelhidão principalmente no rosto e pescoço.
Esta temperatura elevada pode provocar convulsões (“ataques”) e
são por isto bastante perigosas. Existem pessoas também que
descrevem ter “engolido a língua” e quase se sufocarem por causa
disto. Ainda, em casos de dosagens elevadas, o número de batimentos
do coração sobe exageradamente, podendo chegar até acima de 150
batimentos por minuto.
Aspectos
Gerais
O
abuso destas substâncias é relativamente comum no Brasil. O Artane
chega a ser a terceira droga mais abusada entre meninos em situação
de rua de algumas capitais no Nordeste (após os inalantes e a
maconha). Nas demais regiões o uso de anticolinérgicos é bem
menos frequente.
Estas
drogas não desenvolvem tolerância no organismo e não há descrição
de Síndrome de Abstinência após a parada de uso contínuo.
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